Ao lermos «As Cidades Invisíveis» de Italo Calvino, deparamo-nos com transfigurações do real que tomam como ponto de partida múltiplas cidades, que espelham, ainda que ocultando, os desejos e anseios mais profundos do ser humano, resultado da sua relação com os outros e, sobretudo, com o mundo que o rodeia.
Trata-se de uma obra repleta de metáforas, analogias, de simbolismo, de palavras que penetram nos labirintos da escrita levando a outros labirintos, conduzindo o leitor numa verdadeira travessia por cidades imaginárias, territórios que aprisionam e libertam desejos e sentimentos antagónicos, onde o maravilhoso é inexaurível. Cidades que não se encontram em parte alguma mas que são todas as cidades onde estivemos, estando em todos os locais por onde passámos.
O leitor é remetido para as malhas da cidade, numa constante desterritorialização dos sentidos, mediante imagens caóticas sugeridas por pequenas narrativas fragmentadas e independentes, onde em cada uma é apresentada uma realidade, sempre em registo surreal. O livro é composto por 55 pequenos contos interligados pelos diálogos entre Marco Polo e Kublai Khan, correspondendo a 55 cidades fantásticas, todas com nomes femininos.
A história que serve de pretexto à obra baseia-se nos relatos de Polo ao imperador mongol sobre as cidades que visitara no império, uma vez que o imperador não pode abandonar a capital para as visitar. É sob este fundamento que Calvino traça o retrato destas cidades perdidas no tempo e no espaço, que «como os sonhos são construídas de desejos e de medos», cidades carregadas de surrealismo, onde se podem encontrar ruas pavimentadas a estanho, teatros de cristal, galos de ouro que cantam do alto de torres e mulheres banhando-se na piscina de um jardim.
Através de descrições fascinantes e oníricas, Calvino desperta-nos o desejo de conhecer melhor estes locais, ler livros inteiros cuja trama se desenrole nestas cidades onde a magia predomina, como nas Mil e Uma Noites. É assim que o autor, como um arquitecto que projecta as cidades, enreda o leitor nas suas teias e jogos de palavras, construídos com a precisão geométrica de uma régua e esquadro, reflexões filosóficas que nos transportam para cidades, verdadeiro «zodíaco de fantasmas da mente».
«As Cidades Invisíveis» deixa transparecer um Italo Calvino para quem a subtileza dos pormenores e a procura de um sentido mediante o simbolismo que retira de todas as coisas é o caminho literário a percorrer, em direcção à construção de um significado mais profundo para o sentido de toda a existência.
Italo Calvino
As Cidades Invisíveis.
11ª edição
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